quarta-feira, 6 de novembro de 2013

OPACA TRANSPARÊNCIA: RENATO VIEIRA OSTROWSKI E A POÉTICA DA COLOQUIALIDADE


    
(Artigo publicado originalmente no Jornal Relevo - Outubro 2013)
 

A poesia brasileira atual às vezes parece estar tão incógnita que fica difícil separar bons e maus poetas. O leitor de poesia é, antes de mais nada, assim como o próprio poeta, um sobrevivente, um resistente, um revolucionário. Quem, além dos diletos leitores do nosso bravo periódico e meia dúzia de acadêmicos, lê poesia hoje? Imagino que não haja muitas respostas possíveis. Nem é preciso.

Há uma boa e consistente safra de poetas curitibanos atuais. Curitiba não é mais a retrógrada, reacionária e carola capital de um simbolismo tardio e capenga que perdurou graças à meia dúzia de poetas bairristas de igreja. As fronteiras se abriram e o terreno literário local se expandiu. Tanto que escritores de outras cidades e estados vivem em Curitiba, como Cristóvão Tezza, Roberto Gomes, José Castelo e Décio Pignatari (morto em dezembro do ano passado)que viveu em Curitiba desde 1999.

Renato Vieira Ostrowsky, carioca, atualmente vive em Campo Magro. Engenheiro civil de formação, é na poesia que se encontra e desencontra consigo próprio todos os dias. Publicou em 2012 seu primeiro e tardio livro, Opaca Transparência (Editora Kairós, 122 p.).

Opaca Transparência é dividido em seções organizadas com alguma aproximação temática ou estrutural entre os poemas. A poesia de Ostrowsky é bastante clara, direta, quase cristalina, flerta com o óbvio de um cotidiano aparentemente banal, mas o faz com pleno domínio da forma e técnica poética. Passeia por terrenos mais formais, com versos mais rigorosos, rimados, e também por formas bastante livres, praticamente devaneios filosóficos ou aforismos inseridos em um formato versificado.

Outro fator positivo são as constantes referências ao próprio fazer poético, assumindo a metalinguagem como objeto de reflexão e labor. O flerte com a poesia concreta é explorado com responsabilidade, não tornando o livro como um todo uma coletânea de poesia concreta, mas cria diálogos atemporais com o concretismo. Há vários exemplos de fortes e bem sucedidos apelos visuais, como nos poemas Obtuso dicionário e Espigão. Este último, apesar de ter uma forma já usada pelos irmãos Campos com freqüência (cada verso apresenta uma única palavra. Os irmãos Campos denominavam essa forma de poema de poema claustrofóbico), Ostrowsky nos brinda com um poema bem construído e original.

Ostrowsky deixa um pouco a desejar em alguns poucos poemas em que se refere ao fazer poético como um dom quase divino e em alguns casos beira a carolice ao modo de Helena Kolody, como nos poemas Simplicidade e Vida Viva. Mas Opaca Transparência apresenta mais pontos positivos do que negativos.

Como um todo é um belo livro com poemas fortes. Ostrowsky geralmente acerta de primeira nos títulos dos poemas, como no belo Terno de vidro sem gravata e licença poética, no qual Ostrowsky escreve: “Vesti meu terno de vidro/exerci minha opaca transparência/me apaixonei pela vida/bradei meu grito de independência”. Por que opaca? Para os outros? Para si próprio? E essa independência só é alcançada com a poesia.

Renato Vieira Ostrowsky é um criador de imagens, de metáforas e um habilidoso poeta que apresenta diversas faces poéticas desde versos rimados e mais tradicionais a formas mais livres e despojadas com elementos da coloquialidade. É um belo livro de estréia que só um poeta experiente poderia produzir.       

   

Um comentário:

  1. Gostaria de parabenizar pela obra, a melhor dos últimos tempos, a forma com q o autor coloca as metáforas o faz ir a uma viagem literária. Um forte abraco

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