Em pleno mês de Março, Renatinho, sentado na
banqueta mole de madeira molhada, contemplava os Santos da capelinha do
botequeiro. “Ora bosta de Santos: Expedito, burro; Francisco, pobre; Benedito,
preto! Cadê a porra do São Renato?”. Gole em pinga. Gole em cachaça.
Golegolegole na gasolina do posto da esquina. Passa pra lá! Gritava o
frentista. Bêbado maldito! Dizia o mendigo. “Sou o rei, o Rei Nato!”. Fechava
Março com aguardentes, queimando o resto de verão. No passo torto deslizou o
calçadão da rua XV; tropeçou no caminho dos cegos, caiu no chafariz, vomitou
nalguns orelhões e urinou no chapéu da estátua prateada. Avistou uma biblioteca. “Palácio de Rei Nato!
Aí hei de ser”, abriu alas frente aos seguranças, entrou pelo lado da saída,
fazendo o alarme anti-furto apitar, “Quem ousa roubar meus livros? Cobro no
mínimo R$2,99 por essas pérolas!”. Senhor, retire-se. Pedia o segurança. “Seu
cu, ó servo!”. Senhor, por favor. “Mete-te em teu lugar, vassalo insolente, há
de se ver com minha justiça caso a mim se dirija novamente”. Pois bem. Um
usuário irritado, brabo de tanto ler, pegou dom Rei Nato pelo colarinho,
encaminhou-lhe porta a fora; um pontapé, soco na boca do estômago, cuspe bem
dado na cara, recitou Batatinha quando nasce/ esparrama pelo chão/ o ébrio ego
do tolo Santo Rei deposto. Profano bobo-da-corte.
*Mateus Senna é curitibano. Escritor e professor, já publicou nos periódicos Relevo e Flaubert.
Nenhum comentário:
Postar um comentário