Existe literatura em
Curitiba. Nem todo mundo sabe, mas os autores estão aí, produzindo,
trabalhando, publicando. Tudo bem que há uma movimentação editorial ainda em
embrião (muitos curitibanos publicam por editoras do Rio, São Paulo, Porto
Alegre), mas há um movimento literário forte em Curitiba que não segue
necessariamente um padrão ou uma tendência específica.
Boa parte dos escritores
curitibanos escrevem mas ainda não publicam com regularidade. A maioria não tem
contrato com editora nem vínculo formal com algum órgão de comunicação. Fato
interessante, porém nada novo, é que grande parte desses escritores ainda não
publicados escreve poesia. Há muitos poetas anônimos, alguns bons, outros muito
bons, outros irrelevantes, outros péssimos. Mas é fato que a maioria se ocupa
com a poesia. Onde estão os contistas e romancistas da nova geração curitibana?
Há vida inteligente depois de Dalton Trevisan e Cristóvão Tezza?
Sim, há. E da melhor
qualidade. Cezar Tridapalli, escritor curitibano nascido em 1974, publicou em
2011 o romance Pequena Biografia de
desejos (7Letras), no qual narra as agruras e peripécias de Desidério, um
porteiro que nutre em segredo o desejo de tornar-se escritor. Sua busca por uma
voz literária própria é repleta de percalços e fracassos que o tornam muito
humano.
Desidério é um sujeito
provisório, de passagem, ou seja, ele não tem bagagem literária, cultural, e o
desejo (a escolha do nome do protagonista não foi por acaso) de escrever
torna-se sua maior ambição, beirando a obsessão. Durante toda sua jornada a
certeza da não realização de seus projetos literários vai se evidenciando cada
vez mais, mas ele não desiste.
O anti-herói de Pequena Biografia de desejos só não é
completamente brutalizado pela rotina porque torna-se um leitor assíduo.
Ingênuo, inexperiente, mas voraz. Todos os dias faz o mesmo trajeto de casa
para o trabalho em dias que não acontece nada diferente. Desidério vai sofrendo
uma espécie de emparedamento metafísico irredutível durante toda sua vida. Seu
casamento, suas lembranças da infância quando foi abandonado pela mãe, a
presença do pai vegetal o empurram a um abismo que parece não ter fim.
Porém, quando de fato está
emparedado (literalmente) na guarita do prédio onde trabalha, se liberta.
Liberta-se através dos livros que lê e das várias narrativas que escreve, como
um Winston Smith que, à espreita em um canto escuro da alcova, busca seu
momento de epifania.
Cézar Tridapalli acertou
em optar pelo foco narrativo em terceira pessoa porque os movimentos de
Desidério precisavam ser acompanhados por um narrador onisciente. Ao mesmo
tempo, as costuras que Tridapalli faz entre a voz do narrador onisciente e
imparcial às narrativas de Desidério são os artifícios mais eficientes do
romance. A metalinguagem é explorada de forma consciente, na medida certa, sem
tornar-se cansativa e experimental demais. Essas são características caras às
estéticas chamadas pós-modernas.
Pequena
Biografia de desejos chama a atenção também por ser o romance
de estreia de Tridapalli. Narrativa envolvente, movimentada que em momento
algum cai no senso comum, no clichê pós-moderno artificial. Cézar Tridapalli
estreou na narrativa longa com um romance de peso, de gente grande. Há muito
mais a ser mostrado na terra de Trevisans, Tezzas, Buenos, Leminskis...
Dia 31/5, sábado, em Curitiba, a partir das 16h, convido para o lançamento do meu próximo romance, "O beijo de Schiller", que venceu o Prêmio Minas Gerais de Literatura. Será na Livraria Arte & Letra:
ResponderExcluirAl. Presidente Taunay, 130 – Fundos da Casa de Pedra – Batel – Curitiba.
Telefone
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