(Artigo publicado originalmente no Jornal Relevo - Setembro 2013)
Muito já foi discutido e
escrito sobre as distinções entre os gêneros conto e crônica. Alguns teóricos
insistem em enfatizar uma clara distinção entre os dois gêneros narrativos: o
que configura o conto para um teórico como Massaud Moisés, é seu caráter ficcional,
ao passo em que a crônica é um texto de não ficção, uma espécie de diálogo
informal com o leitor. A coloquialidade é uma das características da crônica.
Porém, essa distinção não
se sustenta muito, pois há vários exemplos de escritores que romperam certas
barreiras que tornavam os gêneros diferentes entre si, como Rubem Braga, Moacyr
Scliar, Carlos Heitor Cony e vários outros. Em Curitiba há exemplos de
cronistas como Cristovão Tezza, Roberto Gomes, Miguel Sanches Neto, Domingos
Pelegrinni (os dois últimos não são de Curitiba, mas publicam em periódicos da
capital) que são exemplos de bons ficcionistas que não são tão relevantes na
crônica, nesse bate papo com o leitor.
Carlos Dala Stella,
artista plástico e poeta, é mais um exemplo de escritor que acerta nos contos e
deixa muito a desejar nas crônicas (se seguirmos aqui as distinções entre os
dois gêneros). Carlos Dala Stella, nascido em Curitiba em 1961, publicou em
2000 a coletânea de crônicas Riachuelo,
266, pela editora Criar. No volume há 26 textos que foram publicados em
periódicos que abordam temas diversos, como idiossincrasias do povo curitibano,
relação entre adultos e crianças, arte e literatura.
Com exceção dos belos Perdido beco sem saída, Uma casa em Campo Magro,
Feliz Natal e um brinde à cólera, no qual tece considerações pertinentes
sobre a novela Um copo de cólera, de
Raduan Nassar, o restante das crônicas não tem vigor narrativo, abordam
banalidades cotidianas parecendo que foram escritas por um escritor temeroso
demais em errar e assim evitando abordar temas relevantes.
No texto homônimo, uma
espécie de misto de conto, crônica e notícia policial, Dala Stella mostra-se um
contista bastante original, construindo um narrador onisciente que interpela o
leitor mostrando-se um assassino frio. As descrições de ambientes sórdidos do
centro de Curitiba são bem exploradas, inclusive com referências geográficas
precisas, que dão verossimilhança a atitudes brutais banalizadas do cotidiano. Vale
ressaltar nesse conto a relação do texto com as imagens da capa do livro, que
mostram dois agressores que invadem uma loja na Rua Riachuelo e, aparentemente
sem motivo algum, atacam o proprietário com uma faca. A sequência dos
quadrinhos da capa do livro simulam as ilustrações características de notícias
policias da Tribuna, com traços de qualidade propositalmente duvidosa.
Como um todo, Riachuelo, 266 não apresenta grandes
novidades. Tirando os textos citados, as crônicas não chamam a atenção para aspectos
estruturais narrativos e retratam pequenos recortes óbvios e enfadonhos do
cotidiano urbano. Difícil não bocejar durante a leitura.
Um fator que acaba se
tornando muito ingrato aos cronistas é a própria natureza da crônica, que tende
a ser, até certo ponto, descartável diante da enxurrada de informações que
recebemos todos os dias. É um gênero que envelhece muito rápido, diferente do
texto de ficção. O que Riachuelo, 266 apresenta
de mais interessante são justamente os dois ou três contos do volume que, mesmo
não salvando a obra, não a tornam completamente irrelevante.